Artigo de Amarildo Cenci, diretor da Contee e presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT) Rio Grande do Sul.
(Artigo publicado originalmente no Zero Hora de 24 de janeiro de 202)
O mundo do trabalho está passando por profundas transformações. São inovações tecnológicas, mudanças na organização das empresas e alterações nas relações de trabalho. Indústria e comunicação são as áreas mais impactadas.
Essa realidade, apesar dos ganhos de produtividade e elevação dos lucros, não trouxe melhorias na qualidade de vida dos trabalhadores, na distribuição da renda e na redução das desigualdades. O que tem é a continuidade do desemprego e o crescimento da informalidade e da precarização, como o trabalho intermitente (a legalização do “bico”) e a uberização do trabalho, travestida de “empreendedor”.
Além disso, após o golpe de 2016, as conquistas obtidas com greves no século passado estão sendo eliminadas por legislações aprovadas a toque de caixa nos parlamentos. Pregadores da terceirização e da reforma trabalhista prometeram milhões de empregos, o que não passou de fake news.
Depois da reforma da Previdência, feita para agradar aos bancos, que obriga a trabalhar mais e receber benefícios menores, o governo Bolsonaro editou a MP 905, que altera ou revoga 86 itens da CLT. Entre os retrocessos, está a carteira verde e amarela, que reduz salários e FGTS para jovens, a liberação do trabalho aos domingos sem pagar horas extras e o fim da regulamentação de várias profissões.
A mesma agenda de corte de direitos ocorre em âmbito estadual e em municípios submissos ao projeto neoliberal, penalizando servidores e serviços públicos. O caminho é seguir resistindo para salvar o que resta de trabalho com direitos e impedir a volta ao século 19, quando os senhores da casa grande escravizaram e criaram uma mentalidade desumana que o tempo não apagou.
O Brasil não pode assistir passivamente à destruição do trabalho decente e o retorno às senzalas, assim como não pode tolerar o desmonte do Estado democrático de direito. É preciso reagir e questionar, como fez a cineasta Petra Costa, diretora do filme Democracia em vertigem, indicado ao Oscar 2020: “Como lidar com a vertigem de ser lançado a um futuro que parece tão sombrio quanto nosso passado mais obscuro”.